Um exercício de roteiro

Dos filmes bacanas que assisto, numa sala de cinema ou em casa, sempre me pego fazendo um exercício de roteiro - extrair a cena que revela a história do filme, a cena chave. É um exercício de concisão que compartilho com os amigos amantes de cinema e de roteiro, mais particularmente. Aqui não há adjetivos, descrições, muito menos o final da história. Você poderá, eventualmente, ouvir a voz dos personagens ao ler o trecho de uma fala ou outra. Assitindo ao filme você poderá concordar comigo ou não, se a cena que escolhi é mesmo a cena chave, afinal as boas histórias podem ser entendidas de diferentes maneiras. Todavia, uma coisa eu garanto: você terá mais da experiência cinematográfica, compreendendo melhor os enredos.

Acompanhe Cena chave e bom filme!

Homens e Deuses




Homens e Deuses, de Xavier Beauvois, escrito por ele e Etienne Comar — Grande Prêmio do Festival de Cannes em 2010. Argélia, 1996, um grupo de monges cistercienses franceses se encontra acuado em meio à escalada da violência de uma guerra civil. Estão diante do dilema de ficar e continuar a obra de caridade, como o atendimento médico à população sofrida do local, ou deve partir e, assim, garantir sua segurança. Numa reunião com os líderes comunitários, um dos monges diz que eles se sentem como pássaros pousados no galho, sem saber se ficam ou voam para outro lugar. Uma mulher que acompanha a conversa o contradiz: “Vocês são o galho, nós somos os pássaros”. Frei Luc do alto dos seus 82 anos: “Não tenho medo da morte, sou um homem livre”. Cena de grande impacto a que mostra o helicóptero militar sobrevoando o mosteiro com os monges entoando juntos seus cânticos de devoção. Mas a música, que é rara no filme, volta com força. Durante a ceia regada com vinho — no catolicismo o vinho representa o sangue de Cristo que é derramado por nós — uma fita cassete reproduz a música O Lago dos Cisnes, de Tchaikovsky. O diretor Xavier Beauvois fecha em close-ups nos homens, despe-os de sua condição de sacerdotes, e se fixa no silêncio, no olhar, na lágrima, mostra a decisão tomada quanto ao futuro de cada um. Homens e deuses mostra o ser humano que, de forma consciente ou inconscientemente, vive em devoção a Deus, e mesmo assim tão próximos de seu martírio e amor incondicional, fraqueja, titubeia, para sublimar heroicamente sua limitação humana em compreender e interpretar os dogmas e as escrituras sagradas fundadoras de cada religião.